A Farsa de Inês Pereira: Uma análise do cómico e da condição social das personagens

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No diálogo com Lianor Vaz (vv. 944-970)

No diálogo com Lianor Vaz (vv. 944-970), Inês mostra-se dissimulada, falsamente pesarosa com a morte do Escudeiro: “finge (…) estar chorando”; lamenta a sua “ventura”, uma vez que nem sequer engravidou do Escudeiro “Bem quisera eu dele casta, mas não quis minha ventura” (vv. 949-950). Para tornar mais verosímil a sua dor e para não parecer muito apressada na aceitação de um novo casamento, mente acerca da conduta de Brás da Mata “Quem perdeo um tal marido, tão discreto e tão sabido, e tão amigo da minha vida?” (vv. 957-959).

No monólogo (vv. 971-979)

No monólogo (vv. 971-979), Inês mostra-se muito diferente do fingimento anterior. Demonstra estar preparada para casar novamente seja com quem for, como prova a interjeição “Andar”, isto é, “Seja! Adiante!” (v.971). Assume que prefere casar com um asno, que só de a ver fique contente. Neste monólogo faz-se, ainda, referência a uma parte do provérbio que originou a peça “asno” e “cavalo”, o que nos leva de imediato a, mais uma vez, associar o Escudeiro ao cavalo e Pero Marques ao asno.

No diálogo e na visita ao Ermitão (vv. 1064-1099)

No diálogo e na visita ao Ermitão (vv. 1064-1099), quando percebe que o Ermitão é um antigo namorado/pretendente, Inês mostra a intenção de o visitar, gozando, assim, plenamente, o dom da liberdade de que havia estado privada durante o casamento com o Escudeiro, “eu tenho por devação dar esmola a um ermitão. E não vades vós comigo” (vv. 1059-1061). Ao longo da viagem, Inês adúltera, aproveita-se de forma trocista da ingenuidade de Pero Marques, “Marido cuco me levades. E mais duas lousas.” (vv. 1132-1133). De forma cómica, Pero Marques aceita esta sua condição: “Pois assi se fazem as cousas.” (vv. 1148)

Manual

Durante a cerimónia do casamento (vv. 980-1002)

Durante a cerimónia do casamento (vv. 980-1002) – Atitude lisonjeira, inconsequente (vv. 997-998). Contudo, mantém os modos rudes que mostrara no início da farsa (vv. 983-986).

Quando fica a sós com Inês (vv. 1003-1114)

Quando fica a sós com Inês (vv. 1003-1114), mostra-se um pouco imbecilmente, disposto a satisfazer todos os pedidos de Inês, sem perceber a astúcia da mulher (vv. 1009-1014).

Quando cumpre o desejo de Inês (vv. 1099-1148)

Quando cumpre o desejo de Inês (vv. 1099-1148), revela-se irrefletido, acede a todos os pedidos da astuta mulher, carregando-a às costas, a caminho de um encontro com um amante. A sua pouca instrução não o deixa perceber o conteúdo da cantiga que Inês o incentiva a cantar, cujos versos aludem, de forma clara, à infidelidade da mulher (vv. 1132-1133; 1144-1145).

Manual - 3. O recurso ao cómico é um dos artifícios usados por Gil Vicente.

3.1. Aponte dois tipos de cómico distintos, presentes na caracterização de Pero Marques, explicitando a sua intenção.

O cómico está ao serviço de uma intenção satírica e moralizadora. A personagem comporta-se de modo cómico durante a cerimónia do casamento, querendo pôr o “carro à frente dos bois”, ao questionar se não há trigo para festejar o casamento; o cómico de linguagem aparece nas suas réplicas e de Inês, uma vez que Pero não percebe o significado das palavras ditas pela esposa (VV. 1003-1007). Por outro lado, a visão do lavrador carregando Inês às costas, para atravessar o rio, é também uma situação cómica.

3.2. Relacione esta afirmação com o argumento da obra “mais quero asno que me leve que cavalo que me derrube”, explorando os seus significados.

4. Indique o recurso expressivo presente na expressão “Sempre fostes percebido pera cervo”

Trata-se de uma metáfora que pretende aludir ao homem traído (o mesmo acontece com a palavra cuco).

5. Manual - A Farsa é um género do modo dramático com características satíricas que, retratando o quotidiano, pretende pôr em relevo problemas sociais. Com base na leitura global da obra, comprove a veracidade da afirmação anterior, relacionando-a com os seguintes aspetos.

Episódios do quotidiano - a. Vida de Inês

A vida de Inês retrata a vida amorosa de uma jovem que pretende libertar-se, através do casamento, da vida rotineira das mulheres do seu tempo. Ilustra também a situação de adultério.

b. Função de Lianor Vaz e dos Judeus

As alcoviteiras e os judeus funcionam como profissionais casamenteiros.

Personagens de carácter cómico e/ou satírico - c. Pero Marques

A ingenuidade, a simplicidade e a ausência de educação cortês do homem rural, mas também a sua pureza de carácter e de sentimentos.

d. O Escudeiro

Representante dos fidalgos pelintras; a falsidade e a dissimulação, exemplificadas tanto no tratamento inicial de Inês como na relação com o Moço, quando em presença de estranhos; a falta de escrúpulos para atingir vantagens materiais, patentes tanto na exploração do Moço como na obtenção de vantagens por meio do casamento com Inês (a Mãe dá-lhe a casa); a opressão e a repressão da mulher; a cobardia em contraste com a coragem fingida.

6. Manual – Demonstre que, em Gil Vicente, o modo como a personagem se expressa traduz a sua condição social, considerando as personagens Pero Marques e Brás da Mata.

Ao longo da obra são vários os exemplos relativos a Pero Marques que comprovam a sua condição de camponês. Observe-se, no primeiro encontro, a linguagem que remete constantemente para a sua profissão e estatuto social; no que se refere ao escudeiro fidalgo, repare-se na linguagem elogiosa com que cumprimenta Inês, o que sugere um contacto com ambientes palacianos.

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